O tripé do sucesso da pesquisa americana
Às vezes temos a impressão que faltam recursos para a pesquisa no Brasil. Entretanto, os dados do Banco Mundial indicam que a nossa situação não está tão ruim assim. Dentre os 82 países, o Brasil ocupa a 29ª posição em percentual do Produto Interno Bruto (PIB) investido em pesquisa, isso significa que investimos 1,17%. Quando analisamos o valor absoluto, a situação melhora muito. Empenhamos o 9º. maior volume de recursos em pesquisa do mundo com mais de U$ 28 bilhões investidos em 2014. O contingente de pesquisadores também é relevante. Apesar de termos apenas a 46ª maior relação de pesquisadores por milhão de habitantes, temos o 10º. maior volume, com mais de 137 mil pesquisadores. Consequentemente, o total de recursos por cada um ultrapassa os 200 mil dólares por ano, nos colocando na 17ª posição neste quesito. Talvez a percepção de que não investimos muito em pesquisa exista porque temos a sensação de que pouco dessa pesquisa volta para o mundo real. Infelizmente, o baixo nível de inovação do Brasil corrobora com esta tese, como aponta o ranking global de inovação (INSEAD 2017), que coloca o Brasil sobre a 69ª posição dentre 127 países. A análise fria dos números não revela gargalos como a burocracia, ineficiência e má distribuição dos recursos - que certamente são grandes pedras no caminho da pesquisa nacional - mas também nos faz pensar sobre o nosso modelo de desenvolvimento de pesquisa. Junto com grupo de técnicos e diretores da Federação da Agricultura de Mato Grosso (Famato), Instituto de Economia Agropecuária (Imea), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR-MT), Associação do Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) e Universidade Federal de MATO Grosso (UFMT), no último mês de outubro, tivemos a incrível oportunidade de conhecer importantes universidades americanas e refletir sobre o nosso modelo de pesquisa olhando um país líder em vários dos rankings apresentados. Passamos pelas universidades de Ohio, Minessota e Texas. Para nós, o grande objetivo era entender o motivo do sucesso dos americanos. A resposta não veio no entendimento de como eles vencem a burocracia, ineficiência e má distribuição, mas em como a pesquisa se integra com o ensino e a extensão. Foi uma verdadeira aula. Não é à toa que os Estados Unidos da América (EUA) ocupam um espaço tão importante na economia mundial. Diferente do Brasil, lá as universidades realmente desenvolvem o tripé ensino, pesquisa e extensão. E não é coisa recente. A base estabelecida deste tripé foi dada em 1.862 pelo senador americano Justin Smith Morrill, que criou as chamadas Land Grant Universities ou, com uma tradução livre, Grandes Universidades Públicas. Assim, o governo americano doaria terras e recursos para que além do ensino, estas universidades tivessem condições de realizar pesquisa e extensão. Vale ressaltar, que mesmo nestas universidades públicas o ensino é pago, sendo oferecido gratuitamente apenas os resultados de pesquisa e as ações de extensão. Este modelo é levado tão a sério que os profissionais são contratados com dedicação especificada em contrato. Ou seja, o percentual de dedicação pode variar de zero a 100 podendo incluir um, dois ou até os três pilares dos eixos ensino, pesquisa e extensão. Em Minessota, por exemplo tem percentuais que diferem, mas tem apenas dois perfis de atuação, ou pesquisadores/extensores ou pesquisadores/professores. Apesar de simples este modelo tem uma relevância estratégica gigantesca, pois a extensão garante o pleno acesso aos problemas de quem produz. Quando o pesquisador é extensionista, ele recebe diretamente o feedback do seu produto e, mesmo quando este pesquisador não faz extensão, sempre haverá um na porta ao lado. Aqui no Brasil, de maneira geral, as universidades públicas têm como foco ensino e pesquisa. Na outra ponta temos as entidades que fazem pesquisa e extensão, como a Embrapa, Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (Empaer) e o próprio SENAR-MT. Entre estes dois mundos, além das barreiras burocráticas, existem também barreiras institucionais, ideológicas, culturas e até pessoais travando o fluxo de informações e efetividade dos serviços. Mudar o modelo de funcionamento das nossas universidades seria a melhor opção, mas certamente não é a mais viável, já que além de recursos, falta o longo caminho da formação de capital humano para o fim de extensão. Além de reconhecer o problema, talvez a solução mais viável seja nós, como sociedade civil, assumirmos a comunicação entre a pesquisa, extensão e ensino, já que esta é a mais afetada pelos resultados destes pilares. Certamente esta não é a solução mais fácil, já que implica em uma mudança cultural, mas este seria o melhor remédio para vários dos males que as instituições brasileiras padecem atualmente.
Fonte: Otávio Celidonio é superintendente do SENAR-MT